28 de fev. de 2009

Ditabranda e a nossa ignorância

Trecho retirado de editorial da Folha de São Paulo do dia 17 de fevereiro passado:

…Hugo Chávez venceu o referendo de domingo, a segunda tentativa de dinamitar os limites a sua permanência no poder. Como na consulta do final de 2007, a votação de anteontem revelou um país dividido. Desta vez, contudo, a discreta maioria (54,9%) favoreceu o projeto presidencial de aproximar-se do recorde de mando do ditador Fidel Castro.


Outra diferença em relação ao referendo de 2007 é que Chávez, agora vitorioso, não está disposto a reapresentar a consulta popular. Agiria desse modo apenas em caso de nova derrota. Tamanha margem de arbítrio para manipular as regras do jogo é típica de regimes autoritários compelidos a satisfazer o público doméstico, e o externo, com certo nível de competição eleitoral.


Mas, se as chamadas "ditabrandas" -caso do Brasil entre 1964 e 1985- partiam de uma ruptura institucional e depois preservavam ou instituíam formas controladas de disputa política e acesso à Justiça-, o novo autoritarismo latino-americano, inaugurado por Alberto Fujimori no Peru, faz o caminho inverso. O líder eleito mina as instituições e os controles democráticos por dentro, paulatinamente…

O sentido é claro, minimizar um passado negro de repressões que culminou na morte de milhares de pessoas que tinham valores e ideais de liberdade, algo que algumas mídias fazem questão de esconder e, pelo jeito, destoar.

Não houve “ditabranda” alguma. Eu, com pouco mais de 25 anos de vida, sei muito bem que foi um regime violento e totalitário, ditatorial ao extremo, onde aqueles que eram contrários a opiniões daqueles que tomaram o poder, sofriam consequências que culminavam invariavelmente em marcas profundas e feridas que perseguem até hoje algumas famílias deste Brasil, não importando a classe social.

É impressionante a distorção que a Folha fez neste editorial feito a uma semana atrás e que ainda ressoa bastante na internet (veja esta busca básica e entenda o porque). Eu sou contra ao continuísmo exagerado praticado na Venezuela. É fato que todo poder estabelecido por longo tempo gera ruídos em qualquer governo.

Mas, ao comparar e diminuir o que aconteceu no Brasil no anos 60 até os anos 80, ela demonstra falta de respeito e sensibilidade em relação a história da nossa nação.

Assim, a Folha e seus editores retroagem, ao assinarem tal ponto de opinião que, em algum momento, lembra aquilo que a própria Folha, sobre alcunha do seu antigo nome Folha da Tarde, um dia fez como é comprovada por Tese de doutorado (clique aqui para entender um pouco mais).

PS: Por ventura deste caso, eu lembro de um fato curioso que ocorreu comigo algum tempo atrás. Indo para o trabalho, estava no Trem as 6:30 da manhã e como sempre, várias conversas decorriam ao meu lado enquanto eu apenas tentava não dormir em pé. E um senhor, de aproximadamente 40 anos de idade começa reclamar a outro de como estava o Brasil na época. Era Mensalão para cá, Sanguessugas para lá, além de xingamentos e esbravejos contra os políticos. Até a frase arrebatadora que me chamou atenção e enfureceu aquela minha manhã:

“Nós devíamos voltar com a Ditadura. Era tão bom para gente naquela época.”

Talvez isso incentive a Folha escrever tamanha bobagem. Não acho que seja ignorância do rapaz, mas sim a nossa ignorância de não indignar-se como antes. Ou como nunca foi feito.

Um comentário:

Elise disse...

Não concordo com essa definição "Ditabranda", mas há quem diga que, comparada às outras ditaduras ocorridas na América Latina, a que ocorreu aqui foi bem leve. Não é questão de "branda ou dura", o fato é que houveram ditaduras que minaram a democracia nos países. A Folha foi bem infeliz ao publicar este tipo de assunto com uma parcialidade gritante...